Saúde mental de servidores do Ministério Público Brasileiro vira tema de pesquisa
De acordo com a pesquisa, mais de 80% podem desenvolver transtornos, que impactam individualmente e nas relações de trabalho no cumprimento das funções institucionais
Cerca de 90% dos membros e 85,6% dos servidores do Ministério Público possuem risco aumentado para o desenvolvimento de transtornos mentais comuns. Desse total, 73% apresentam humor depressivo-ansioso (nervosismo, tensão e preocupação), 52% assinalaram pensamentos depressivos, 56% indicam possuir sintomas somáticos (alteração do sono) e 48% apontaram um decréscimo de energia vital (cansaço com facilidade).
A pesquisa foi realizada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e contou com o apoio da Federação Nacional dos Servidores dos Ministérios Públicos (Fenamp). Mais de 4 mil pessoas foram entrevistadas para que se chegasse a esse diagnóstico.
“Identificar os riscos psicossociais é de suma importância para compreender todo esse contexto: no caso dos membros (promotores e procuradores), a sobrecarga de trabalho, o esgotamento mental, a falta de pessoal, a sobrecarga de lidar com relações interinstitucionais, ataques externos, distância da família e dos centros urbanos. Já os servidores convivem com sentimentos de desgaste, desânimo, injustiça, discriminação e violência no trabalho (assédio moral e sexual)”, afirmou o presidente do Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Amazonas (SINDSEMP-AM), Marlon Bernardo.
Segundo a pesquisa, todas essas condições de risco impactam não somente na esfera individual, mas também nas relações de trabalho, no cumprimento das funções institucionais e, em última análise, na prestação dos serviços de qualidade esperados pela população.
Apesar de ser um problema conhecido (porém pouco enfrentado), a gravidade da situação impressiona: 6,7% dos integrantes do MP Brasileiro possuem ou já possuíram alguma espécie de ideação suicida. Além disso, 38,8% dos participantes informaram que iniciaram tratamento de saúde mental após o ingresso na Instituição, apontando a situação no trabalho como fator preponderante para a busca do tratamento.
“É importante observar que esse resultado poderia ser pior, em razão da subnotificação de casos de saúde mental impulsionada pelo estigma gerado sobre o paciente, pela inexistência de espaços de acolhimento nas instituições e pelos prejuízos profissionais que a revelação do problema pode gerar. Para muitas pessoas, silenciar sobre o tema ainda é uma das maneiras mais eficazes de se proteger”, afirma Marlon.
A partir desse diagnóstico, a ex-presidente da Comissão de Saúde do CNMP, Sandra Krieger Gonçalves, formulou uma proposta de Resolução sobre a Política Nacional de Atenção Continuada à Saúde Mental.
Um dos pontos mais relevantes da norma é o estabelecimento de responsabilidades em três níveis: individual, coletivo e institucional. Este último busca mudar a cultura institucional ao trazer deveres aos diversos órgãos da estrutura organizacional dos MPs, além de instituir mecanismos e práticas para reverter essa realidade.
Nesse sentido, a proposta inclui a participação das Ouvidorias e das Corregedorias como forma de suprir a deficiência dos canais necessários para comunicação, denúncia, encaminhamento e apuração dos casos de violência no trabalho. Além disso, o texto garante a participação de integrantes dessas unidades nas comissões de prevenção e combate a todos os tipos de assédio (moral e sexual) e discriminação.
Em uma decisão inédita, o Procurador-Geral de Justiça do Amazonas, Alberto Rodrigues, autorizou a participação do sindicato na Comissão de Assédio do MPAM.
No ano passado, a entidade sugeriu que o Ministério Público do Amazonas disponibilizasse atendimento e acompanhamento psicológico online a membros e servidores, utilizando a ferramenta tecnológica contratada pela Instituição, para realização de teleconsultas (ou escutas) de modo a oportunizar este serviço aos profissionais de todas as unidades da capital e dos municípios do interior.
Multicanais de atenção
A oferta de multicanais de atenção à saúde mental no cenário pós-pandemia vem sendo uma tendência nacional.
No último dia 13 de junho, o Ministério da Saúde lançou o serviço Linha Vida (196), um projeto-piloto de acolhimento e direcionamento que iniciará pelo Distrito Federal e funcionará 24 horas por dia.
Além disso, será lançado o Projeto Teleconsulta (telepsiquiatria e teleterapia), para auxiliar as pessoas que estão lidando com os impactos na saúde mental causados pela pandemia da covid-19. Serão disponibilizados, mensalmente, de forma online, 12 mil teleconsultas de psicólogos e 6 mil teleconsultas de psiquiatras. Os serviços serão agendados pelas equipes das Unidades Básicas de Saúde (UBS).
Foto: Divulgação